sexta-feira, 29 de junho de 2012

Como podemos dar atualidade à questão do socialismo hoje? (A visão clássica e sua real incidência no PT – João Machado) [1].

Como podemos dar atualidade à questão do socialismo hoje? Como pensar formas de caminhar na direção do socialismo que não estejam sujeitas aos problemas vividos pelos países onde ele foi implantado?

Mas, antes de entrar nessa parte principal do debate, quero ainda fazer um rápido comentário sobre a primeira parte da exposição. Embora esteja de acordo com boa parte dela, eu questionaria algumas coisas.

Em primeiro lugar, acho que é um erro identificar qualquer planejamento centralizado com o planejamento total de todas as decisões da economia, e, em consequência, com um planejamento totalitário.

Ao contrário, creio que é perfeitamente possível imaginar um planejamento centralizado não apenas do ponto de vista de um país, mas do mundo inteiro inclusive, no qual apenas algumas decisões seriam centralizadas. A grande maioria das decisões seriam amplamente descentralizadas.

Algumas questões seriam decididas em âmbito mundial, por exigências de racionalidade e pelo interesse coletivo da humanidade. Por exemplo, questões que envolvem o esgotamento de recursos naturais não renováveis.

Ou a destinação de recursos para a pesquisa científica: não faz nenhum sentido achar que a melhor maneira de fazer pesquisa científica é por meio da concorrência entre vários países.

O progresso da ciência exige mais colaboração internacional, e não a defesa do segredo comercial ou dos direitos de propriedade intelectual, como querem os “pensadores” da Organização Mundial do Comércio (OMC).

O que estou dizendo é que, se é mais racional pensar em várias questões de um ponto de vista mundial, daí não se segue que deveríamos planejar todos osdetalhes da vida econômica em âmbito mundial. Isso seria um completo absurdo.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

A visão de Marx, ou a de Lenin, não podem ser confundidas com o que se implantou na União Soviética. (A visão clássica e sua real incidência no PT – João Machado) [1].

A visão de Marx, ou a de Lenin, não podem ser confundidas com o que se implantou na União Soviética. E a grande maioria dos que se referenciam nelas, como eu próprio, por exemplo, não apenas tem uma visão muito crítica do “socialismo que realmente existiu”, como além disso acha que é necessário repensar as idéias de Marx, ou de Lenin, ou até mesmo de Trotski (para citar um crítico fundamental do modelo de socialismo da União Soviética) sobre o socialismo à luz da experiência histórica.

Não creio que o conservadorismo na concepção de socialismo seja um problema hoje no PT. Pelo contrário, creio que o problema hoje é justamente o oposto. Ou seja, há uma tendência crescente dos filiados ao PT no sentido de reduzir o socialismo a uma idéia moral bastante vaga – alguma coisa como a defesa de uma sociedade mais justa.

Já quase não se defendem, de fato, concepções que tenham um conteúdo efetivamente socialista. O problema não está, portanto, num apego a idéias socialistas do passado, está na aceitação pouco crítica de muitas das idéias anti-socialistas do presente.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

O movimento pelo socialismo no Brasil é muito mais amplo do que se imagina. (A visão clássica e sua real incidência no PT – João Machado) [1].

Acho que discutir hoje o socialismo é da maior importância, e infelizmente as possibilidades de fazê-lo de forma mais ampla têm sido muito pequenas ultimamente.

Em segundo lugar, fico feliz em debater com o Paul Singer, que na minha opinião, dentro do PT e no âmbito do movimento mais amplo que ainda tem uma referência no socialismo no Brasil, tem sido nos últimos anos quem mais tem se empenhado para renovar essa discussão, para manter a questão do socialismo sempre atual.

Recentemente, cursei uma disciplina na Universidade de São Paulo (USP), com Paul Singer como professor, na qual o socialismo, seus problemas, suas possibilidades foram muito discutidos. E descobri então que o movimento pelo socialismo que existe hoje no Brasil é muito mais amplo do que eu imaginava.

Fiquei surpreendido com a diversidade e a riqueza das experiências de formas de economia solidária existentes no Brasil e fora do Brasil. Acho que em geral os filiados do PT têm pouca noção da amplitude dessas experiências, e é muito importante divulgá-las e discuti-las mais.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

A luta pelo socialismo nunca cessa. (A economia socialista no sistema socialista) [1].

A experiência auto-gestionária contemporânea, no Brasil e alhures, deixa claro que muitos trabalhadores preferem ser assalariados, mesmo tendo a oportunidade de trabalhar por conta própria ou em cooperativas.

Se no futuro o socialismo se tornar hegemônico, é possível e até provável que a maioria prefira integrar empresas socialistas. Para que tais empresas sejam autenticamente socialistas, é imprescindível, no entanto, que os que a elas se associarem o façam espontaneamente. O que só será possível se houver empresas capitalistas, por conta própria, e outras oferecendo entradas alternativas na produção social.

Em suma, a economia socialista provavelmente sofrerá (por quanto tempo ninguém sabe) a concorrência de outros modos de produção. Ela estará permanentemente desafiada a demonstrar sua superioridade em termos de auto-realização dos produtores e satisfação dos consumidores.

O que talvez leve à conclusão de que a luta pelo socialismo nunca cessa. Se este for o preço que os socialistas terão de pagar para ser democratas, ouso sugerir que não é demasiado.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

A convivência de diversos modos de produção numa sociedade. (A economia socialista no sistema socialista) [1].

O sistema capitalista engloba diversos modos de produção além do capitalista. Nele atuam, lado a lado, trabalhadores por conta própria que formam a produção simples de mercadorias, empresas públicas e privadas sem fins de lucro, produção para auto-subsistência nos lares e cooperativas auto-gestionárias, que constituem um embrião ou “implante” socialista.

O sistema é capitalista porque o modo de produção capitalista é econômica e socialmente predominante. Os outros modos de produção se submetem e se adaptam à supra-estrutura legal e política que fundamenta a hegemonia capitalista.

Acredito que no socialismo não deveria ser diferente. Nos países do “socialismo realmente existente” os outros modos de produção estavam proibidos, acabando por constituir atividades econômicas ilegais e semi-ilegais. Isso viola direitos humanos essenciais.

Todos os cidadãos devem ter o direito de organizar suas atividades econômicas de acordo com suas preferências, desde que não firam direitos alheios. Portanto, de todos os modos de produção conhecidos, só a servidão e a escravidão deveriam ser proibidas.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

terça-feira, 26 de junho de 2012

A função dos bancos no mercado socialista. (A organização socialista da produção) [1].

Caberia aos bancos (que provavelmente seriam públicos) financiar os projetos novos, segundo normas e diretrizes aprovadas pelo parlamento econômico. Os bancos deveriam funcionar como incubadoras ou ter ligação com incubadoras de empresas socialistas.

A função do sistema financeiro seria apoiar os projetos que representantes dos consumidores considerassem de grande potencial ou significação social. É possivelmente a forma melhor de desenvolver novas forças produtivas.

Ao mesmo tempo, o sistema financeiro teria por incumbência liquidar iniciativas fracassadas ou que esgotaram sua utilidade social. A insuficiência de demanda por seus produtos deveria ser o principal indicador de fracasso, mas se as pessoas envolvidas num desses projetos quisessem continuá-lo, a decisão final deveria caber a elas.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

A função do mercado socialista. (A organização socialista da produção).

A função do mercado socialista é viabilizar a liberdade de iniciativa de pessoas ou grupos com novas ideias ou novos projetos.

Eles deveriam ser encorajados a oferecer seus produtos sem constrangimento e sem ter de obter licença de alguma instância planejadora.

A sociedade socialista deveria encorajar jovens, trabalhadores desempregados em função do avanço tecnológico ou de outras mudanças, consumidores insatisfeitos com bens ou serviços etc. a tomar a iniciativa de inventar novos produtos, novos processos de produção e lançá-los em competição com os existentes.

A competição nesses casos deveria durar até que os consumidores estivessem decididos a adotar os produtos novos ou ficar com os velhos.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

O mercado socialista. (A organização socialista da produção) [1].

O mercado socialista difere do capitalista porque não é matriz de acumulação de capital privado. A acumulação se dá em empresas pertencentes coletivamente a seus participantes ativos, como produtores ou consumidores.

O parlamento econômico deveria desenvolver políticas de fomento que impedissem a polarização de empresas exitosas cada vez mais ricas de um lado e outras, desfavorecidas e cada vez mais pobres, de outro.

As razões do insucesso das últimas deveriam ser apuradas e superadas numa ação conjunta dos sócios com os representantes dos consumidores, contando com o apoio externo de consultorias, laboratórios e centros de treinamento.

O ideal é ajustar a produção em quantidade, qualidade e preço às necessidades dos consumidores. (A organização socialista da produção) [1].

A competição pode ser agradável aos compradores, mas implica considerável desperdício de valor, causado por estoques invendáveis ou que só podem ser vendidos a preços de liquidação.

O ideal é ajustar a produção em quantidade, qualidade e preço às necessidades dos consumidores, de antemão e não por tentativa e erro, como faz a competição em mercado.

Isso permite recolocar a questão da regulação por mercado ou por órgão político representativo.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

A competição entre empresas socialistas. (A organização socialista da produção) [1].

Um aspecto delicado é o da competição entre empresas socialistas. Esta não deveria existir, já que seria artificial criar uma oposição de interesses entre empresas socialistas.

O ideal é que se formassem grandes cooperativas de consumidores
– como houve muitas até meados deste século – que pudessem se associar a um elevado número de cooperativas de produção.

Em cada uma delas, a direção seria compartilhada por representantes de trabalhadores e consumidores, de modo que os interesses de ambos estivessem presentes nos planos econômicos a serem desenvolvidos. Isso tornaria a competição entre empresas desnecessária.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Em nenhum tipo de empresa socialista haveria trabalhadores assalariados. (A organização socialista da produção) [1].

Em nenhum tipo de empresa socialista haveria trabalhadores assalariados, a não ser em casos excepcionais em que o trabalhador, tendo a opção de se associar à empresa, prefere não o fazer.

Mesmo assim, o trabalho assalariado só seria aceitável em caráter temporário, até que a empresa tenha encontrado trabalhadores que possam cumprir a função e se tornem sócios.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

As empresas teriam a possibilidade de se federar, constituindo o que hoje são cooperativas de segundo grau. (A organização socialista da produção) [1].

As empresas teriam a possibilidade de se federar, constituindo o que hoje são cooperativas de segundo grau, terceiro grau etc. Essas multiempresas socialistas também seriam administradas de acordo com os princípios da autogestão.

As empresas socialistas federadas preservariam sua autonomia parcial e a base do poder de decisão teria de ser a assembléia geral de todos os sócios ou delegados eleitos por eles. Portanto, elas seriam muito diferentes das multiempresas capitalistas, que são geridas autoritariamente a partir de um centro único.

A razão de federar empresas seria a economia de escala em serviços comuns (contabilidade, comercialização, pesquisa etc.) e a coordenação de atividades complementares, como o desenho de produtos que uma empresa fornece a outra.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

As empresas pertenceriam coletivamente aos trabalhadores associados ou a uma sociedade de trabalhadores e consumidores. (A organização socialista da produção) [1].

No atual patamar tecnológico, parece adequado que a produção esteja organizada em um número grande de empresas autônomas de diferentes tamanhos. Elas pertenceriam coletivamente aos trabalhadores associados ou a uma sociedade de trabalhadores e consumidores.

Em nenhuma das empresas o capital seria de propriedade de terceiros, isto é, de não-trabalhadores ou não-consumidores. A organização das empresas deveria se submeter aos princípios do cooperativismo, particularmente ao da autogestão, que tem por base um voto por cabeça, a soberania da assembleia dos sócios e a eleição para todas as instâncias de mando.

Outro princípio importante seria o da porta aberta: os indivíduos teriam o direito de ingressar na empresa e de deixá-la, evidentemente respeitando os interesses dos demais integrantes.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

A conquista de uma economia socialista será fruto, provavelmente, do avanço do movimento operário e socialista em uma série de frentes [1].

A conquista de uma economia socialista será fruto, provavelmente, do avanço do movimento operário e socialista em uma série de frentes:

Na extensão da democracia do âmbito político ao econômico e social;

Da participação da população organizada na elaboração de orçamentos públicos e na gestão de equipamentos escolares e de saúde;

Na conquista de governos locais e regionais por coligações de esquerda que possam pôr em prática desde já políticas socialistas, inclusive de apoio e fomento a empresas autogestionárias;

De novos direitos de representação operária nos locais de trabalho, com direito de exame das contas da empresa e de participação em seus centros de decisão;

E por fim, mas não por último, a construção de um setor de economia solidária nas cidades e no campo, inclusive em terras conquistadas pela reforma agrária, em que produção, distribuição e consumo, crédito e seguro formem um todo multiforme e harmonioso em que se reforcem mutuamente.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

terça-feira, 19 de junho de 2012

A falta de conhecimentos gerenciais e políticos pode representar um obstáculo decisivo ao avanço rumo a uma economia socialista, mesmo quando as circunstâncias parecem favoráveis. (Crítica da visão clássica) [1].

As crises e tendências degenerativas indicam que o socialismo autogestionário, construído dentro de sociedades capitalistas, tem poucas possibilidades de provocar uma transformação estrutural na economia inclusiva.

Os kibutzim e Mondragón, não obstante, tiveram uma influência política considerável, inspirando movimentos semelhantes em outros países.

Hoje, o cooperativismo autogestionário assume dimensões significativas em vários países, sobretudo na Itália, na Espanha e no Canadá, e vai ganhando importância em países vítimas de desemprego em massa, como o Brasil.

A economia socialista dificilmente será alcançada por meio do mero crescimento da economia solidária, que abrange também o cooperativismo de crédito, bancos do povo, clubes de troca e outras instituições.

A importância dessas experiências é o aprendizado que proporcionam a segmentos da classe trabalhadora de como assumir coletivamente a gestão de empreendimentos produtivos e operá-los segundo princípios democráticos e igualitários.

Como ficou dramaticamente evidente na Revolução de Outubro, a falta de conhecimentos gerenciais e políticos pode representar um obstáculo decisivo ao avanço rumo a uma economia socialista, mesmo quando as circunstâncias parecem favoráveis.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

Todas as experiências autogestionárias aqui resumidas passaram ou ainda passam por crises. (Crítica da visão clássica) [1].

Todas as experiências autogestionárias aqui resumidas passaram ou ainda passam por crises.

Após a morte de Tito, a Iugoslávia explodiu em lutas étnicas de excepcional crueldade, que acabaram com o país e sua experiência autogestionária.

Economicamente, ela havia proporcionado à Iugoslávia um desenvolvimento mais equilibrado e um autoritarismo político atenuado, em comparação com os países do “socialismo real”.

Os kibutzim atingiram o seu apogeu nos anos 80, mas a nova geração rebelou-se contra alguns dos princípios de seus pais e avôs, como o das crianças serem criadas separadamente dos pais, na Casa das Crianças.

Gradativamente, com o aumento do padrão de vida, os gastos com serviços adquiridos fora do kibutz foram crescendo, tornando mais importante a disponibilidade de dinheiro.

Resolveu-se dar oportunidade de estudo universitário a todos os membros e muitos passaram a trabalhar como profissionais liberais fora do kibutz.

Tendências desagregadoras culminaram recentemente no pagamento de remunerações em dinheiro e na cobrança em dinheiro também de todos os bens e serviços consumidos. Em alguns kibutzim chegou-se ao extremo de diferenciar a remuneração, de acordo com critérios aceitos pela maioria, com a menor remuneração sendo igual ao salário médio do país.

Em Mondragón, a necessidade de competir no âmbito da União Européia levou à adoção de medidas centralizadoras, com a redução da autonomia das cooperativas no complexo; aumentou a margem de trabalho assalariado e a diferença entre retirada máxima e mínima.

Para uma parte dos trabalhadores, a única vantagem que o cooperativismo lhes dá é segurança no emprego. Aumenta a distância entre a cúpula de velhos cooperadores e a base de operários que não viveram os anos heróicos de sua criação, na Espanha de Franco.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Talvez seja hoje a mais importante experiência de socialismo autogestionário: o Complexo Cooperativo de Mondragón, no País Basco (Espanha). (Crítica da visão clássica) [1].

Talvez seja hoje a mais importante experiência de socialismo autogestionário: o Complexo Cooperativo de Mondragón, no País Basco (Espanha), fundado pelo padre José Maria Arizmendiarreta, a partir de uma escola profissional, em 1956. É formado hoje por mais de cem cooperativas, que se espalham pela Espanha e têm em conjunto mais de 40 mil membros.

As primeiras cooperativas de Mondragón eram industriais, mas logo em 1959 foi criada a Caja Laboral Popular, que se tornou um dos maiores bancos do país e é uma cooperativa de segundo grau, de propriedade das demais cooperativas do Complexo.

Mas, em todas as cooperativas de segundo grau de Mondragón – há várias dedicadas à pesquisa tecnológica, outra de seguro social etc. –, os trabalhadores e empregados são sócios da cooperativa também.

Em seu início, o trabalho assalariado no Complexo estava limitado a 10% do total e tinha caráter temporário, a diferença entre retirada máxima e mínima era de 4 para 1 e em cada cooperativa havia um Conselho Social que representava os trabalhadores na Junta de Governo, eleita por eles.

O Complexo Cooperativo de Mondragón funciona hoje como um grande conglomerado multinacional, em competição com os seus similares capitalistas.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

A primeira geração de membros dos kibutzim praticou o lema comunista: “De cada um segundo suas possibilidades, a cada um segundo suas necessidades”. (Crítica da visão clássica) [1].

Outra experiência de socialismo autogestionário de vulto foi a dos kibutzim em Israel. São comunas que constituem cooperativas integrais, isto é, de produção e de consumo.

Os meios de produção são de propriedade coletiva, o trabalho é organizado e administrado por comitês eleitos, todas as decisões mais importantes são tomadas em assembléia.

A primeira geração de membros dos kibutzim praticou o lema comunista: “De cada um segundo suas possibilidades, a cada um segundo suas necessidades”; não circulava dinheiro na comunidade, homens e mulheres trabalhavam por igual, e recebiam in natura seus meios de subsistência.

O primeiro kibutz data de 1910 e seu número cresceu continuamente, alcançando cerca de 125 mil habitantes nos anos 80.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

Continuou viva a idéia de que trabalhadores associados poderiam organizar-se em empresas autenticamente autogestionárias e desafiar assim a prevalência das relações capitalistas de produção. (Crítica da visão clássica) [1].

Os pequenos agricultores, nominalmente donos da cooperativa, tornaram-se dependentes da direção da cooperativa para vender seus produtos a bom preço e obter insumos a crédito.

A dominação e a exploração de camponeses por “suas” cooperativas passaram a ser bastante comuns, evidenciando tendências degenerativas no cooperativismo.

Não obstante, continuou viva a idéia de que trabalhadores associados poderiam organizar-se em empresas autenticamente autogestionárias e desafiar assim a prevalência das relações capitalistas de produção.

No início da Revolução Russa, essa prática foi bastante geral e inspirou a Oposição Operária durante anos.

Ela surgiu em outras oportunidades revolucionárias, na Guerra Civil
Espanhola, na Polônia e em diversas ocasiões.

O governo comunista da Iugoslávia, chefiado por Tito, após romper com Stalin, em 1948, introduziu a autogestão em todas as empresas do país, combinando-a com o planejamento geral, possivelmente na linha do que defendia a Oposição Operária, no começo dos anos 20. Foi a mais extensa experiência de socialismo autogestionário, tendo durado quase 40 anos.

Gradativamente, o planejamento geral foi sendo substituído por uma espécie de socialismo de mercado, infelizmente distorcido pelo regime de partido único.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Pode-se dizer que o cooperativismo como desafio prático e pacífico ao capitalismo era uma realidade significativa no fim do século XIX. (Crítica da visão clássica) [1].

Pode-se dizer que o cooperativismo como desafio prático e pacífico ao capitalismo era uma realidade significativa no fim do século XIX, quando se tratou de criar a Aliança Cooperativa Internacional (ACI).

Na época, estourou um grande debate no meio cooperativista, a respeito da autogestão nas empresas criadas por cooperativas de consumo e de comercialização agrícola, as mais poderosas então.

A maioria dos líderes e teóricos do cooperativismo, que tomaram a iniciativa de formar a ACI, eram partidários das cooperativas de produção autogestionárias e esperavam que as cooperativas de consumo as capitalizassem e lhes comprassem a produção.

Mas os dirigentes das cooperativas de consumo preferiam formar empresas industriais e agrícolas, com mão-de-obra assalariada. Não queriam que os trabalhadores tivessem participação nos lucros e muito menos na gestão das empresas.

Era claro que essa posição estava em contradição com os princípios socialistas do cooperativismo, mas tinha a seu favor o fato de que os próprios trabalhadores daquelas empresas não reivindicavam a autogestão, satisfazendo-se com os direitos sindicais e trabalhistas.

Essa luta terminou com a vitória dos que se opunham à autogestão e representavam o alvorecer de um cooperativismo de negócios, que se tornou muito comum daí em diante.

O mesmo aconteceu com as cooperativas de comercialização agrícola, que se multiplicaram e fortaleceram, formando indústrias de alimentos para defender seus associados dos intermediários privados.

Também nestas indústrias, os trabalhadores eram assalariados. Em muitos casos (inclusive no Brasil), as empresas agroindustriais das cooperativas agrícolas tornaram-se muito fortes economicamente. Possuíam staffs de engenheiros e outros especialistas, e seus dirigentes assumiam a condição de grandes executivos, o que de fato eram.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

O cooperativismo operário e camponês teve grande desenvolvimento na Europa e depois na América do Norte e em outras partes do mundo. (Crítica da visão clássica) [1].

Owen exerceu real liderança política na Inglaterra, na primeira metade do século passado, tendo merecido o maior respeito e consideração da parte de Marx e Engels.

Ele ajudou a formar cooperativas e lhes atribuiu uma missão revolucionária, qual seja a de organizar operários grevistas para tomar o mercado dos capitalistas.

A primeira tentativa de fazer isso, na década de 1830, fracassou, mas a idéia sobreviveu e inspirou os Pioneiros de Rochdale, cuja cooperativa, fundada em 1844, tornou-se a mãe de todas as cooperativas.

O cooperativismo operário e camponês teve grande desenvolvimento na Europa e depois na América do Norte e em outras partes do mundo.

Cooperativas de consumo tornaram-se organizações de massa na Grã-Bretanha, formaram centrais atacadistas que se lançaram ao comércio internacional, chegando a possuir plantações nas colônias.

Cooperativas de crédito foram criadas para camponeses e para artesãos, na Alemanha, também a partir de meados do século XIX, e se difundiram por toda a Europa.

O mesmo aconteceu com cooperativas de produção a partir da França e com cooperativas de trabalho a partir da Itália.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

A Revolução Russa extremou uma distinção que já havia entre duas concepções de socialismo. (Crítica da visão clássica) [1].

O socialismo como autogestão – A Revolução Russa extremou uma distinção que já havia entre duas concepções de socialismo, que até então conviviam nas mesmas organizações partidárias, sindicais e cooperativas.

Uma destas concepções, como vimos na segunda seção, via no socialismo o continuador do capitalismo, ao menos durante uma longa fase de transição para o comunismo.

Na União Soviética, essa concepção adquiriu caráter totalitário, ao ver no planejamento geral e na concentração do poder os princípios do socialismo.

A outra via no socialismo a ruptura com a ditadura do capital nas empresas e sua substituição pela gestão coletiva dos meios de produção exercida pelos produtores livremente associados.

A concepção autogestionária era herdeira de Owen, Fourier e outros socialistas utópicos do século XIX, que imaginavam a passagem para o socialismo mediante a construção de comunidades livres e igualitárias, cujo exemplo converteria a maioria a favor da nova sociedade.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.

O grande argumento contra a distribuição por mercados é que eles tendem a favorecer os ricos e, no caso dos mercados financeiros, a aumentar os desníveis econômicos. (Crítica da visão clássica) [1].

Não haveria plano geral, do tipo soviético, mas planos particulares de firmas, famílias e governos a serem conciliados em mercados e no plano geral, pelo parlamento econômico.

Mercados são essenciais para possibilitar ao indivíduo o direito de escolha, como trabalhador e como consumidor. O qual implica o direito ao arrependimento e o direito de saída da instituição, cujo exercício teria de ser restrito pelo respeito aos direitos dos demais indivíduos.

Não há vantagem em sistemas de racionamento, isto é, de alocação política de bens e serviços. O que se deveria almejar seria a distribuição gratuita de produtos essenciais, tendo em vista tornar o seu consumo universal, como os serviços de saúde e de ensino.

Mas isso é o oposto do racionamento, que sempre distribui produtos escassos.

O grande argumento contra a distribuição por mercados é que eles tendem a favorecer os ricos e, no caso dos mercados financeiros, a aumentar os desníveis econômicos.

Ora, uma economia socialista não pode tolerar a existência de pobres. Qualquer cidadão teria de ter acesso pleno à satisfação de suas necessidades básicas, mediante a criação de uma renda cidadã suficiente.

A partir desse ponto, a persistência ou não de desigualdade econômica deveria ser deixada ao parlamento econômico, dependendo da noção de justiça da maioria dos cidadãos nele representados.

Há um argumento de peso, no entanto, de que alguma desigualdade econômica deve ser permitida exatamente para garantir aos indivíduos o direito de escolha entre diferentes estilos de vida. A igualdade econômica geral tornaria esse direito quase inexistente.


[1] Paul Singer e João Machado, Série Socialismo em discussão, ECONOMIA SOCIALISTA, EDITORA FUNDAÇÃO PERSEU ABRAMO, 1a edição: junho de 2000, São Paulo.